sábado, 31 de março de 2012

Um pouco de brincadeira na vida, senão eu sufoco...




Peço aqui licença a meus irmãos brincantes Ivan e Thiago, para discorrer um pouco das minhas digressões de pensamento sobre o Brincar de Viver. Minha intenção aqui não é falar diretamente ou indiretamente sobre o projeto dos dois, mas pegar carona na idéia e fazer a minha própria viagem.

Já apontei em outros posts o quanto, no nosso dia-a-dia, novas correntes se atam a nossos corpos, nos impedindo de seguir certas direções. No entanto, elas não só impedem, mas nos apontam e nos guiam para direções estabelecidas ou que estão em vias de se estabelecer. Ou seja, vivemos em meio a modos de vida já padronizados, que ao invés de só ficar nos impedindo de fazer algo, seja pela opressão ou repressão, elas também são positivas, no sentido de que sempre estão se atualizando, produzindo novas formas de vivermos isso que se quer que chamemos de Normal. As vezes, aquilo que aparece enquanto suposta saída, pode ser um novo dispositivo que se produz para nos colocarmos nos eixos. Explicarei melhor com um exemplo, que acaba de me vir a cabeça:

Hoje, 31 de março se institui como sendo o da Hora do Planeta, onde cidades de várias partes do mundo, seus habitantes, se organizam para desligarem as luzes por 60 minutos. Monumentos históricos e turísticos dessas cidades são apagados, a exemplo do Cristo Redentor, aqui no Rio que já está certo de apagar as luzes. Segundo a WWF - entidade que luta pela conservação ambiental, dentro de um contexto social e economico especifico (http://www.wwf.org.br/wwf_brasil/organizacao/) - a hora do planeta é o seguinte: "A Hora do Planeta é um ato simbólico, promovido no mundo todo pela Rede WWF, no qual governos, empresas e a população demonstram a sua preocupação com o aquecimento global, apagando as suas luzes durante sessenta minutos." Não sou afeito a essas coisas. A bola da vez do capitalismo é o discurso de que é possível vivermos em meio a um modo de vida pautado na transformação de tudo e de todos em objeto de consumo, e ainda assim preservarmos o planeta. Preservar o planeta é uma dos novos discursos e dispositivos de legitimarmos o capitalismo enquanto único sistema possível de vida. Grandes empresas, muito conhecidas pela exploração e regimes de trabalho escravistas, como a Mcdonald's, Nike, Eike Batista, são agora os grandes defensores da moral ambientalista. Eu até aceitaria apagar as luzes, simbolicamente, como queirem, mas que em meio a isso fosse posto em discussão esse tipo de vida capitalística. Não há como discutirmos sobre novas formas de nos relacionarmos com nosso planeta, com o meio em que a gente vive, se não pusermos nessa discussão as estratégias de funcionamento do capitalismo. Impossível! Se assim não for, o movimento ambientalista, acabará (como já é!) se transformando no mais novo objeto de consumo do capital. Aliás essa é uma das grandes armadilhas e brilhantismo do capitalismo, fazer de tudo o que emerge como fora do alcance do seu campo de signos, um novo objeto de consumo. Não há lado de fora!

Isso pode aparentar um fatalismo a priori, mas não é bem por aí. Dizer isso, que não há lado de fora, é reconhecer que as estratégias de embate estão aqui, ao nosso redor, elas se fazem a todo momento. Ou seja, não há um mundo para além desse, um campo transcendente onde as coisas se resolveriam, um mundo das idéias, um futuro promissor, o progresso que já está desenhado. Os embates se dão no modo como resolvemos encarar a vida. Pensar que outros modos de vida são possíveis já é um caminho, ou seja, tentar sair do modelo do carro do ano, burguês padrão e pensar "é possível viver sem ter que ter o carro do ano, sem ter que ter um canudo, sem ter q ir a missa todos os domingos e comprar a roupa da moda". Já gritava um muro no movimento do maio de 68 "Sejamos realistas, tentemos o impossível".

Não há fórmulas prontas para isso, pensar assim seria cair na tal armadilha que denuncio, pois esta rapidamente passaria a vender a fórmula no shopping mais perto de sua casa. No entanto, para que uma outra forma de viver possa emergir é necessário que arrisquemos, que ousemos. É necessário que escutemos, assim como Drummond o anjo torto, quando este lhe disse "Vai, Carlos! Ser gauche na vida." O  gauche é uma palavra em francês que significa Esquerda. Ou seja, nos coloquemos sempre a esquerda da vida, é um forma de posicionamento político.Não pensemos a política de esquerda, como vem sendo amplamente falada, para ligar a esquerda a tal partido..tentar se manter a esquerda o máximo possível é buscar outra perspectiva na vida, olhar por outras lentes, pelo para-brisa de Clarice . É Brincar de viver! A brincadeira tem uma ótima característica, algumas tem suas regras ou prescrições, no entanto elas são totalmente flexíveis, se moldam com o andar da brincadeira. É fácil perceber isso ao vermos crianças brincando, a todo momento elas re-inventam-se brincando, saem outras crianças, criam novos mundos, novas relações umas com as outras, etc, etc..até vir um adulto e dizer que a brincadeira é sem lógica, que elas não estão fazendo certo!

Brincar de viver pode ser uma das formas de construirmos saídas, de apontarmos outras formas de viver. De afirmar o impossível. Mas engana-se quem ache que isso só pode ser feito se sairmos de nossos locus, no sentido espacial-concreto, ou seja, se pegar a mochila e sair viajando. Isso seria construir uma fórmula para a coisa. É possível viajar sem ter sair do lugar, sem mover a matéria que é o corpo. Como bem apontava outro pensador, é possível ser nômade sem viajar, sem um deslocamento material. Thiago e Ivan estão construindo para eles uma forma de viver, o pegar a estrada não vai ser o essencial (penso eu), mas o que potencializa essa ação deles é buscar possíveis, em vez de sufocamentos. Espero que muitos com os quais eles cruzarem pelo caminho, possam aprender isso.

Fica aqui meu desejo de boa sorte pela estrada!!! Com certeza estarei (daqui de onde estou) junto com eles e Clarice.

Para saberem da empreitada: http://www.brincandodeviver2.blogspot.com.br/ 

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